Caráter testado

Conversas de Varanda - Com José Peyroton

“Caráter testa-se em coisas pequenas. Quando queremos saber de que lado sopra o vento atiramos ao ar não uma pedra, mas uma pena.”
(Alexander Hamilton)

Pequenos gestos denunciam. Singelas palavras sugerem grandes emoções. Frascos diminutos contêm maravilhosas fragrâncias. Há um grande poder ainda a ser melhor compreendido nas pequenas coisas. É sempre mais seguro experimentar em pequenas doses. E assim ocorre com o humano. Nos grandes projetos nos escondemos, mas nas coisas simples nos revelamos. Pode ser uma ajuda a alguém que não pode nos devolver o favor, pode ser despender um pouco mais de tempo numa conversa onde o interlocutor se mostra aflito, pode ser a escolha cuidadosa de um presente que vai agradar ao outro, ou coisas mais simples como, por exemplo, o modo de sentar, o olhar respeitoso, a elegância no falar, o simples agir com equilíbrio e honestidade – mesmo que ninguém esteja olhando.

Quando numa conversa o assunto se volta para a ética e os valores, nos lembramos imediatamente dos grandes fatos, geralmente envolvendo políticos ou empresários e, posso quase garantir, que saímos em defesa da nobreza, do “bom-mocismo”, do obedecer as regras da sociedade e do desprezo à corrupção.

Mas são os pequenos gestos que denunciam nossos valores e tornam visíveis nosso caráter. E bom caráter está em falta no mercado. Entenda-se por caráter um conjunto de valores. Possuir um conjunto de valores positivos ou negativos fornece a qualidade de nosso caráter. E o teste revela eficácia quando notamos o comportamento nas pequenas demandas cotidianas.

Numa de minhas viagens ao nordeste tive a oportunidade de conhecer um empresário de um importante segmento agroindustrial. No meio da prosa ele me disse que, devido às suas constantes viagens ao exterior, necessitava ter alguém que o substituísse em importantes momentos em sua empresa e nos contatos com clientes e fornecedores. Disse-me ainda que estava disposto a ensinar tudo relativo à função e os “segredos” do trabalho, e que também pagaria um salário condizente com o cargo. Mas ele queria que fosse alguém com um bom conjunto de valores, que possuísse rigor ético e em quem pudesse confiar, mas não estava conseguindo achar a pessoa certa. Quando conhecia alguém que o surpreendia em capacidade, bastava um simples teste de moralidade para constatar que essa mesma pessoa não estava apta para o cargo. Retornei da viagem e nunca mais me esqueci das palavras daquele empresário.

Quantas oportunidades de bons trabalhos passam por nós todos os dias? Quantas vezes somos observados em atitudes corriqueiras, onde o natural é enganar e “tirar vantagem”, e não percebemos que estamos sendo medidos, comparados, analisados e, finalmente, julgados por pessoas e empresas de todos os tipos?

Observe-se primeiramente, localize suas ações e reações aos pequenos estímulos diários que o convidam a burlar, negar, esconder, disfarçar, distorcer, enganar, tirar vantagens. Fortaleça-se, disciplinadamente, levando seu ser a agir em conformidade com seus valores e, quando tiver de decidir em coisas maiores, certamente saberá fazer o que é correto.

José Peyroton
Consultor Organizacional em desenvolvimento humano
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